Para esse número da Bikodisse poderíamos dispensar essa introdução. Primeiro, por que a nossa bikuda é conhecida por muitos. Segundo, por que ela tem respostas precisas, diretas e sem rodeios consegue mandar o “papo reto”.
Essa jovem liderança negra e feminista, representa muito bem o que a nossa história conta sobre o nome político adotado por ela. Quem a vê tem a imagem de uma mulher forte e guerreira. Quem a conhece tem certeza disso!
E para quem ainda não sabe quem é Carla Akotirene, deixamos que ela mesma faça a sua apresentação:
Essa jovem liderança negra e feminista, representa muito bem o que a nossa história conta sobre o nome político adotado por ela. Quem a vê tem a imagem de uma mulher forte e guerreira. Quem a conhece tem certeza disso!
E para quem ainda não sabe quem é Carla Akotirene, deixamos que ela mesma faça a sua apresentação:
Bikodisse: Quando e por que você resolveu adotar “Akotirene” como parte do seu nome e qual importância dessa grande heroína ?
Carla Akotirene: Adotei Akotirene como meu nome político em 2004, na primeira turma do Projeto POMPA (Mentes e Portas Abertas – Instituto Steve Biko). Naquele momento, muito mais que uma formação política, obtive com a Makota Valdina, a oportunidade de resgatar a minha ancestralidade e cosmovisão africana. Nessa (re) desconstrução identitária também passei a ser acompanhada mais de perto pela Srª Valdina e percebi o erro que eu e minha família cometemos ao abandonar o candomblé e nos converter à Igreja Universal. Foi neste contexto de “asè”(axé), resistência e sabedoria que passei a ser Akotirene e a me esforçar para parecer com esta grande mentora intelectual da organização quilombola.
Bikodisse:Como você conheceu o Instituto Steve Biko? Enfrentou alguma (s) dificuldade (s) para cursar o pré-vestibular? Qual (is)?
Carla Akotirene:Conheci o Instituto Steve Biko em 2003, recomendada pelo ator Jorge Washington, que presenciou uma situação em que fui reduzida ao estereótipo de mulher “gostosa” sem ter nenhuma condição ideológica ou intelectual de responder às duras ofensas destinadas por uma professora em um ensaio do Ilê Aiye. Jorge me alertou da necessidade de uma formação política na Biko, caso contrário, rotineiramente, as pessoas me abreviariam como uma “negra formosa” e nada mais. Fiz a seleção para o Pré-Vestibular, durante a entrevista discordei da existência do racismo no Brasil, das ações afirmativas e de uma série de reivindicações legítimas do movimento negro. Tanto Valdo Lumumba como Marcos Alessandro, entrevistadores e professores do CCN daquela época, me explicaram posteriormente que a minha aprovação se deu por conta da coragem em defender incondicionalmente um ponto de vista, mesmo que equivocado. Portanto, segundo eles após uma formação política, nenhum interesse antagônico ao que clama o povo negro, poderia me encantar ou fazer retroceder. A única dificuldade foi de ordem material, visto que não pude contribuir com as parcelas simbólicas da manutenção do curso, e também porque não possuía recursos para deslocamento, tendo, portanto, que caminhar diariamente da Caixa D’água até a Rua Chile, e em algumas oportunidades sofrer tentativas de violência sexual, pois as aulas terminavam às 22h e começavam às 7h e ocasionalmente nos domingos. De algumas lembranças dessa natureza, a que me chama mais atenção, é o fato de, meu irmão Sandrinho, que mais tarde também veio a ser aluno da Biko, pressentir, certa vez, que algo ruim ocorreria no meu trajeto, e quando o motoqueiro que constantemente me perseguia na Ladeira do Instituto dos Cegos, preparou-se para o estupro, meu irmão apareceu e entrou em luta corporal com ele, pois havia me seguido neste dia.
Bikodisse: É verdade que você já foi cordeira durante o carnaval da Cidade de Salvador? Conte-nos um pouco dessa experiência.
Carla Akotirene:É verdade. Após terminar meu curso técnico em Patologia Clinica em 1998, resolvi não acompanhar totalmente a minha mãe nas “vendagens” do carnaval daquele ano, mas sim trabalhar de outra forma nesta Festa para poder ajudá-la. Apareceram duas oportunidades, as quais aceitei: trabalhar como cordeira do Ilê Aiyê e de segurança no Alô Inter. Bem, não gostei de ambas as experiências, sobretudo, porque a condição de ser cordeira me fez sentir um pedaço de carne barata,todo mundo passava a mão, a polícia batia e os associados reclamavam do serviço. O que somente importava era beleza e a alegria dos negros (as) que desfilavam, e não as violências vivenciadas por nós que estávamos trabalhando nas cordas. Ali eu vi, mas não fui vista. Mesmo assim foi mais gratificante estar entre os meus,me senti orgulhosa por parecer com eles, a ter àquela experiência de estar nos meio dos brancos, ser diferenciada racialmente e convidada para outros tipos de serviços.
Bikodisse: Quais fatores lhe influenciaram na escolha do curso Serviço Social?
Carla Akotirene:As Mulheres Negras que se destacam no cenário político por Igualdade Racial, como Benedita da Silva, Matilde Ribeiro, Márcia Brow, Carmem Flores, Valdeluce Nascimento, dentre outras que fazem um “Outro Serviço Social para o Povo Negro”.
Bikodisse:Você foi uma das 21 jovens lideranças da primeira turma do POMPA (Projeto Mente e Portas Abertas) da Biko. Qual importância do POMPA para sua formação política?
Carla Akotirene:O POMPA fez de mim uma liderança política. Proporcionou-me criticidade, crença em sonhos coletivos, estabelecimento de meta profissional, despertou em mim a ideia de criação do NUMAR- Núcleo de Estudantes Negras da UCSAL Matilde Ribeiro. Por último, criou em mim um senso de lealdade incondicional ao Povo Negro e a um projeto societário que conceba não apenas uma igualdade racial, mas uma reparação, para além das conjunturas do massacre imposto a nossa africanidade. Após a formação do Pompa, aonde quer que eu vá, levo comigo um olhar negro e mal humorado frente ao racismo e suas facetas coloniais. .
Bikodisse: Quando cursava Serviço Social na UCSAL (Universidade Católica do Salvador) você foi uma das fundadoras do NUMAR. Quais as principais ações desenvolvidas pelo NUMAR?
Carla Akotirene: Nesta pergunta, irei repetir o que falei em 2005, momento em que eu, Gilmara Oliveira, Magna Santos, Ana Cristina Jesus e Jaqueline Silva, alunas egressas da Biko, fundamos o NUMAR. Nós procurávamos dar visibilidade ao debate de gênero e etnia no curso de Seviço Social e por conseqüência, o entendimento da Academia sobre a viabilidade de políticas públicas compensatórias, não só pelo perfil de maioria negra das graduandas, mas principalmente pelo perfil da população usuária, geralmente assistidas pelas/os profissionais da área; atuávamos na reformulação curricular do Curso de Serviço Social na teoria e na prática, através de uma rede de interação permanente, onde Universidade e Movimento Social – Comunidades, juntos pudessem alterar a postura do Serviço Social frente às demandas das populações historicamente discriminadas, pois o que não é mais aceitável é incorrer no equívoco de que “a questão é só de classe” e que por méritos próprios seja possível se chegar ao sucesso profissional e pessoal. Isso seria deletar da história da formação da sociedade brasileira, o que representou o escravismo para as populações não-negras, formadoras de um Estado Elitista, rico e racista.
Bikodisse: Desde 2007 você faz parte da coordenação do FONAJUNE (Fórum Nacional de Juventude Negra). Como se deu sua entrada nesse Fórum ? Quais as principais conquistas e quais as próximas ações?
Carla Akotirene:O Fórum Nacional de Juventude Negra é um desdobramento político do ENJUNE-Encontro Nacional de Juventude Negra, em que fui eleita delegada da Bahia no eixo Gênero. A proposta do Fórum é aglutinar as variadas expressões de juventude, e exigir do Poder Público a reversão das propostas que foram formuladas pela juventude negra brasileira durante o ENJUNE, em políticas públicas. Com efeito, na 1ª Conferencia Nacional de Juventude conseguimos eleger o relatório do ENJUNE como primeira prioridade do governo. Aderimos à coordenação nacional do Congresso Nacional de Negras e Negros, compomos o Conselho Estadual e Nacional de Juventude, participamos de pautas internacionais pelos direitos da Juventude, inclusive dos mecanismos civis para substanciar o acordo bilateral entre Brasil e EUA para eliminação da discriminação racial. Consolidamos uma parceria com o Instituto Steve Biko e Fundação Kellog através da Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude e Fundo Manoel Faustino de Apoio às Organizações Juvenis Negras. A nossa próxima ação é desenvolver uma campanha contra o Femicidio de Jovens e alocar forças para a realização do 2º ENJUNE.
Bikodisse:Recentemente você ingressou no mestrado na UFBA. Já é possível nos contar um pouco sobre sua linha de pesquisa?
Carla Akotirene:Faço mestrado no PPGNEIM. Minha linha de pesquisa é racismo e sexismo nas instituições prisionais femininas. Vou aprofundar um estudo que havia iniciado durante a graduação,quando constatei que o racismo e sexismo são tecnologias de poder tão potentes a ponto de permear o espaço prisional, no qual teoricamente, mulheres brancas e negras deveriam estar em condição de igualdade, dado o comportamento delituoso. Institucionalmente, existe a visão de que as mulheres brancas antes de serem criminosas são brancas e isso é um capital para elas dentro da instituição; as mulheres negras são criminosas exatamente porque não são brancas, por isso são mais vigiadas, punidas e desperdiçadas pelo sistema produtivo dentro da prisão, consequentemente da remissão de pena, anuladas pela educação, saúde, sexo-afetividade e outros direitos, logo fadadas ao fracasso social.
Bikodisse:Em sua atuação no FONAJUNE uma das principais ações é o combate ao extermínio da juventude negra. Faltam políticas públicas nessa área? O que você sugere?
Carla Akotirene:O problema é que temos um modelo de Estado que é letal, cuja principal missão ideológica é a matança e encarceramento desenfreado dos jovens, negros e pobres como forma de regular as relações sociais conflitivas depositadas pelos mesmos no cenário de desigualdade social. Não há efetivas políticas públicas, o que existem são ações fragmentadas e inoperantes, que tendem apenas a estigmatizar os espaços urbanos de maioria negra e categorizar como criminosas todas as alternativas de sobrevivência social desenvolvidas pelos seus membros. Este genocídio da juventude negra só irá terminar quando o Estado e os governos se empenharem em políticas preventivas e não essencialmente de confronto e repressão aos nossos corpos negros, numa postura racista e genocida.
Bikodisse: A Lei Maria da Penha traz avanços no combate e punição à violência contra as mulheres? Qual a sua opinião sobre a forma como a lei está sendo implementada?
Carla Akotirene:A Lei Maria da Penha é uma grande conquista das mulheres deste País, uma brilhante reivindicação feminista, que infelizmente se esbarra na cultura patriarcal, que tem feito os agentes do Direito Penal manusear o texto deste instrumento jurídico, num viés de protecionismo machista, haja vista que os juízes, magistrados e demais setores conservadores, não têm conhecimento de gênero necessário para interpretar e sentenciar com rigor os casos de Violência contra a Mulher.
Grande guerreira negra, salve salve Karla Akotirene!!!!
ResponderExcluirParabéns Carla por toda esta sua trajetória. Você é fonte de insparação para @s Bikud@s.
ResponderExcluirProssiga na missão!
Beijos
PARA ALÉM DO INDIVIDUO... SEM DUVIDAS...AKOTIRENE DE ALGUM MODO REPRESENTA UM EXEMPLO DE SUPERAÇÃO DO LUGAR Q A ELITE BRANCA RESERVOU PARA AS MULHERES NEGRAS...O NOSSO DESAFIO É JUSTAMENTE TRANFORMAR ESSA EXCEÇÃO WM REGRA
ResponderExcluirNA FÉ E SEMPRE EM GUARDA,
LIO NZUMBI
Carla Akotirene é tudo isso e muito mais...! Sua trajetória me dá ainda mais certeza que caminhamos em passos firme na luta contra o racismo e sexismo! Carla escreve uma linda historia de luta e superação.
ResponderExcluirMárcia Regina Santos.
Parabéns, Carla. É muito bom conhecer pessoas como você e maravilhoso é descobrir essas pessoas através de um ex-aluno que me apresenta essas pérolas.
ResponderExcluirÊa!!! Saudações Carla Akotirene, ler um pouco sobre a sua trajetória de vida me faz refletir com precisão sobre os passos que necessitamos galgar, sinto-me felicitada por essa entrevista. Forte abraço e aquele Axé!!!
ResponderExcluirKarla, já tive no seu Orkut, acompanho meio q de longe suas colocações... e com esta entrevista a admiro um pouco mais... uma mulher de coragem, firmeza e certa de seus objetivos...
ResponderExcluirParabéns pela entrevista e pela sua trajetória, que com certeza irá muito mais longe e com sucesso na conquista de seus objetivos que tbm não deixa de ser os nossos objetivos qto mulher e guerreira...
Abraço
Rose/VoltaRedonda-RJ
Algumas mulheres são exemplos pelo q são pelo q fazem e pelas suas palavras.Bom saber que Carlinha reúne essas 3 características.sou fã dela e ela sabe disso.
ResponderExcluirOlá Carla,
ResponderExcluirParabéns mulher negra guerreira que a todo custo a toda prova venceu, vence e vencerá as barreiras impostas, por ser mulher por ser negra.
Axé preta parabéns pela sua história.
Salve, salve esta grande mulher, singular em sua forma de ser, admirável personalidade.Esta linda jovem sempre me lembra minha mãe Yansã,rainha guerreira , dona do Rio Niger -África Ocidental.
ResponderExcluirParabens Carla,
ResponderExcluirMuito importante essa tua entrevista. Você é um exemplo de luta que contribui para elevar a auto-estima desse povo negro.
eu gostaria de pantisipar da comunudades ser par familia negra
ResponderExcluirhttp://www.myspace.com/549227096
ResponderExcluirhttp://www.orkut.com.br/Main#Home
hotmail.com add moca121@hotmai.com