BIKO DISSE: "Para realizar uma ação verdadeira, é necessário ser parte viva da África e de seu pensamento; é preciso ser um elemento da energia popular que é totalmente convocada para a libertação, o progresso e a felicidade da África."
Bikodisse: Você nasceu em Guiné-Bissau, como tomou a decisão de vir para o Brasil para continuar os estudos?
Augusto Cardoso: Antes de responder esta questão, gostaria de contar um pouco da minha história. Nasci na República da Guiné-Bissau, precisamente na Ilha de Orango-Grande, na aldeia (vila) de Eticoga. O território guineense é formado por duas partes; uma continental e outra insular, conhecida como arquipélago dos Bijagós. Eu sou um Bijagó, sou o 5º filho de uma família de dez irmãos.
É importante explicar o sentido da palavra Bijagó. A comunidade designada por este nome é originariamente conhecida pelo termo Oujôco, que quer dizer indivíduo ou pessoa, em oposição aos animais irracionais.
Conforme o saber Bijagó, todo indivíduo que não age de forma decente, racional e conveniente não é, e nem pode ser, um Oujôco - não pertence ao grupo humano, e sim, ao mundo dos animais irracionais, dos néscios. O termo Bijagó é uma corruptela que se disseminou na Guiné-Bissau, mas o sentido do vocábulo Bijagó permanece dizendo respeito à sensatez, à hospitalidade, à solidariedade, à lealdade e à racionalidade. Essas características são de tal modo importantes para os membros dessa comunidade, que permeiam aspectos diversos da vida e do estilo de vida dos Bijagós e permanecem orientando diversas práticas e relações interpessoais.
Iniciei o meu estudo primário na Ilha de Orango até a 4ª série. Depois de terminar essa fase, o meu pai entendeu que eu já era alfabetizado, e essa alfabetização tinha valores ocidentais e não Bijagós. Com isso, achou por certo que eu já deveria aprender tudo sobres os valores tradicionais Bijagós, ou seja, aprender saberes e práticas do meu povo. Isso durou três anos, depois desse tempo, no entendimento e aprovação do meu pai eu já era um Oujôco. Com isso meu pai me liberou para seguir em frente com os estudos, que ele chamava de ocidentais. Isso foi de fundamental importância na minha formação e em todas as áreas da minha vida.
Depois desse período, parti para a ilha de Bubaque onde terminei a 5ª e 6ª; as 7ª e 8ª séries na ilha de Bolama, e concluí a 9ª e 10ª, finalmente, em Bafáta. A 11ª e 12ª foram cursadas em Bissau, depois disso, passei 12 anos fora da sala de aula.
Bikodisse: Quais fatores foram determinantes nessa escolha?
Augusto Cardoso: Escolhi continuar os estudos no Brasil ao invés de outro país, primeiro por causa da língua portuguesa que temos em comum, segundo pelo jeito de ser dos brasileiros, o calor humano e aconchego dessa nação, em especial do povo baiano.
Bikodisse: Fale-nos um pouco sobre a Guiné Bissau e a importância de Amilcar Cabral na história do seu país.
Augusto Cardoso: Antes da chegada dos Europeus, a região da atual Guiné-Bissau constituía-se em uma parte do Reino de Gabu, tributário do Império Mali, ao qual esteve vinculada até o século XVIII.
A República da Guiné-Bissau é um pequeno país litoral da África Ocidental, que foi invadido pela colônia europeia entre 1446 e 1974, ano em que se tornou país independente. Faz fronteira com o Senegal, ao norte, e com Guiné Conacri, ao sul e ao leste (ambos os países francófonas). O país tem uma área de 36.125km², sendo uma parte continental e outra insular, o Arquipélago dos Bijagós. O Arquipélago dos Bijagós é constituído por 88 ilhas e ilhéus, e fica situado a pouca distância do litoral do país, oposto à foz do Rio Gêba - que tem 724 km de fronteiras internacionais, 386 km desses com a Guiné Conacri e 338 km com o Senegal. A paisagem é dominada por planícies litorais, que se elevam gradualmente a leste, nas zonas de savana, onde se atingem altitudes de 300m. A Guiné-Bissau tem clima tropical, geralmente quente e úmido. Verificam-se precipitações anuais de 1.500-2.000mm na maior parte do país, embora a região Sul seja mais úmida, excedendo os 2.000mm. A precipitação é nitidamente sazonal, com um regime de monções entre Junho e Novembro e ventos de sudoeste. Segue-se uma época seca de seis meses, de Novembro a Abril. A temperatura média do mês mais frio, em Bissau, é de 25°C, enquanto que a média do mês mais quente é de 28°C.
Neste contexto, do ponto de vista sociocultural, Guiné-Bissau é caracterizada pela diversidade étnica de particularidades culturais. Cada um desses 27 grupos étnicos têm a sua própria forma de ser e de viver, que muitas vezes se reflete no modo particular do estilo de vida social, cultural e espiritual, de organização e ordenamento do território, na construção das habitações, no seu estilo de vestuário; na simbologia, nas crenças religiosas, nos rituais, no jeito de adoração aos seus antepassados, na gastronomia, nas manifestações festivas, na produção artesanal, nas atividades produtivas de natureza econômica e política, dentre outros.
Conforme a organização administrativa do país, no norte, região de Cacheu, predominam as etnias Manjaco e Mancanha; no litoral centro, região de Biombo, está referenciada a etnia Papel; no centro norte, região de Oio, a principal etnia é Balanta; as regiões de Bafatá e de Gabu são predominantemente ocupadas pelos Fulas e Mandigas; na região centro sul, em Quinara, a presença mais comum é dos Beafada; no sul, em Tombali, tradicionalmente são identificados os Nalu; e na região de Bolama-Bijagós, os da etnia do mesmo nome, Bijagós, que habitam todo o arquipélago e, por fim, no Setor Autônomo de Bissau, encontra-se uma multiplicidade de origens étnicas diferentes, mas o território antigamente pertencia ao grupo étnico Papel.
Bikodisse: Você nasceu em Guiné-Bissau, como tomou a decisão de vir para o Brasil para continuar os estudos?
Augusto Cardoso: Antes de responder esta questão, gostaria de contar um pouco da minha história. Nasci na República da Guiné-Bissau, precisamente na Ilha de Orango-Grande, na aldeia (vila) de Eticoga. O território guineense é formado por duas partes; uma continental e outra insular, conhecida como arquipélago dos Bijagós. Eu sou um Bijagó, sou o 5º filho de uma família de dez irmãos.
É importante explicar o sentido da palavra Bijagó. A comunidade designada por este nome é originariamente conhecida pelo termo Oujôco, que quer dizer indivíduo ou pessoa, em oposição aos animais irracionais.
Conforme o saber Bijagó, todo indivíduo que não age de forma decente, racional e conveniente não é, e nem pode ser, um Oujôco - não pertence ao grupo humano, e sim, ao mundo dos animais irracionais, dos néscios. O termo Bijagó é uma corruptela que se disseminou na Guiné-Bissau, mas o sentido do vocábulo Bijagó permanece dizendo respeito à sensatez, à hospitalidade, à solidariedade, à lealdade e à racionalidade. Essas características são de tal modo importantes para os membros dessa comunidade, que permeiam aspectos diversos da vida e do estilo de vida dos Bijagós e permanecem orientando diversas práticas e relações interpessoais.
Iniciei o meu estudo primário na Ilha de Orango até a 4ª série. Depois de terminar essa fase, o meu pai entendeu que eu já era alfabetizado, e essa alfabetização tinha valores ocidentais e não Bijagós. Com isso, achou por certo que eu já deveria aprender tudo sobres os valores tradicionais Bijagós, ou seja, aprender saberes e práticas do meu povo. Isso durou três anos, depois desse tempo, no entendimento e aprovação do meu pai eu já era um Oujôco. Com isso meu pai me liberou para seguir em frente com os estudos, que ele chamava de ocidentais. Isso foi de fundamental importância na minha formação e em todas as áreas da minha vida.
Depois desse período, parti para a ilha de Bubaque onde terminei a 5ª e 6ª; as 7ª e 8ª séries na ilha de Bolama, e concluí a 9ª e 10ª, finalmente, em Bafáta. A 11ª e 12ª foram cursadas em Bissau, depois disso, passei 12 anos fora da sala de aula.
Bikodisse: Quais fatores foram determinantes nessa escolha?
Augusto Cardoso: Escolhi continuar os estudos no Brasil ao invés de outro país, primeiro por causa da língua portuguesa que temos em comum, segundo pelo jeito de ser dos brasileiros, o calor humano e aconchego dessa nação, em especial do povo baiano.
Bikodisse: Fale-nos um pouco sobre a Guiné Bissau e a importância de Amilcar Cabral na história do seu país.
Augusto Cardoso: Antes da chegada dos Europeus, a região da atual Guiné-Bissau constituía-se em uma parte do Reino de Gabu, tributário do Império Mali, ao qual esteve vinculada até o século XVIII.
A República da Guiné-Bissau é um pequeno país litoral da África Ocidental, que foi invadido pela colônia europeia entre 1446 e 1974, ano em que se tornou país independente. Faz fronteira com o Senegal, ao norte, e com Guiné Conacri, ao sul e ao leste (ambos os países francófonas). O país tem uma área de 36.125km², sendo uma parte continental e outra insular, o Arquipélago dos Bijagós. O Arquipélago dos Bijagós é constituído por 88 ilhas e ilhéus, e fica situado a pouca distância do litoral do país, oposto à foz do Rio Gêba - que tem 724 km de fronteiras internacionais, 386 km desses com a Guiné Conacri e 338 km com o Senegal. A paisagem é dominada por planícies litorais, que se elevam gradualmente a leste, nas zonas de savana, onde se atingem altitudes de 300m. A Guiné-Bissau tem clima tropical, geralmente quente e úmido. Verificam-se precipitações anuais de 1.500-2.000mm na maior parte do país, embora a região Sul seja mais úmida, excedendo os 2.000mm. A precipitação é nitidamente sazonal, com um regime de monções entre Junho e Novembro e ventos de sudoeste. Segue-se uma época seca de seis meses, de Novembro a Abril. A temperatura média do mês mais frio, em Bissau, é de 25°C, enquanto que a média do mês mais quente é de 28°C.
Neste contexto, do ponto de vista sociocultural, Guiné-Bissau é caracterizada pela diversidade étnica de particularidades culturais. Cada um desses 27 grupos étnicos têm a sua própria forma de ser e de viver, que muitas vezes se reflete no modo particular do estilo de vida social, cultural e espiritual, de organização e ordenamento do território, na construção das habitações, no seu estilo de vestuário; na simbologia, nas crenças religiosas, nos rituais, no jeito de adoração aos seus antepassados, na gastronomia, nas manifestações festivas, na produção artesanal, nas atividades produtivas de natureza econômica e política, dentre outros.
Conforme a organização administrativa do país, no norte, região de Cacheu, predominam as etnias Manjaco e Mancanha; no litoral centro, região de Biombo, está referenciada a etnia Papel; no centro norte, região de Oio, a principal etnia é Balanta; as regiões de Bafatá e de Gabu são predominantemente ocupadas pelos Fulas e Mandigas; na região centro sul, em Quinara, a presença mais comum é dos Beafada; no sul, em Tombali, tradicionalmente são identificados os Nalu; e na região de Bolama-Bijagós, os da etnia do mesmo nome, Bijagós, que habitam todo o arquipélago e, por fim, no Setor Autônomo de Bissau, encontra-se uma multiplicidade de origens étnicas diferentes, mas o território antigamente pertencia ao grupo étnico Papel.
Importância de Amilcar Cabral na história da Guiné-Bissau
Aos 12 dias do mês de Setembro de 1924, nasce em Bafafá, leste da Guiné, o menino Amílcar Lopes Cabral, filho de Juvenal António Lopes da Costa Cabral e Iva Pinhel Évora. Cabral como qualquer outro jovem da época assiste as atrocidades do sistema colonial. Em 1945, Cabral é um dos primeiros jovens das colônias portuguesas a ser contemplado com uma bolsa para frequentar os estabelecimentos de ensino superior em Portugal e matricula-se no Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa.
A vida desse jovem como estudante constituiu uma oportunidade para aprofundar o seu sentimento progressista anti-colonial, participando ativamente nas atividades estudantis clandestinas que se desenvolviam a volta da Casa dos Estudantes do Império e da Casa de África; segundo a história, foi aí que veio a conhecer outros estudantes africanos como: Marcelino dos Santos, Vasco Cabral, Agostinho Neto, Eduardo Mondlane e outros que se tornariam futuros líderes dos movimentos de libertação.
No início de 1953, Cabral é colocado como engenheiro agrônomo na Guiné-Bissau, para trabalhar na estação agrária experimental de Pessubé. Ele aproveita-se então da sua atividade profissional para percorrer a Guiné de ponta a ponta e adquirir um bom conhecimento do terreno, bem como da constituição social das suas populações. Foi ele quem realizou o primeiro recenseamento agrícola dessa colônia portuguesa.
Amílcar Cabral e seus companheiros, em 19 de setembro de 1956, decidem então fundar o PAIGC (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde). O movimento se manteve pacifico até 1963, quando o PAIGC iniciou a luta armada de guerrilha, visando pôr termo ao colonialismo português. Em 1973 Amílcar Cabral é assassinado em Conacri, com isso é intensificada a guerra e, no mesmo ano, em 24 de setembro é declarada unilateralmente a independência da guerrilha do PAIGC, por ter consolidado 90% do território. Mas um anos depois, em 10 de setembro de 1974, Portugal reconhece a independência do país e a Guiné-Bissau foi a primeira colônia portuguesa na África a ter sua independência reconhecida, constituindo-se na República da Guiné-Bissau.
Como líder das forças de libertação nacional, Amilcar Cabral assumia como condição fundamental da vida política a institucionalização acima do personalismo, com isso garantiu o sucesso político e a capacidade institucional das organizações.
Conforme Cabral, qualquer líder que fizesse jus a esse titulo seria capaz de construir uma organização política que sobrevivesse e atingisse as metas estabelecidas, na presença e ausência desse próprio líder, deixando bem claro que ninguém era insubstituível no PAIGC. Isso explica o não enfraquecimento dessa forças amadas depois da sua morte, como pensava o colonialismo. Amilcar Cabral teve grande importância na formação e na independência da nação guineense e por isso é inseparável a história de ambos.
Bikodisse: Sua adaptação no Brasil foi difícil? Quais semelhanças foram notadas entre a cultura guineense e a baiana?
Augusto Cardoso: A mudança de um continente para o outro sempre é difícil e não foi diferente comigo, tive dificuldades de adaptação sim, mas pouco a pouco foi me socializando com a cultura brasileira. Algumas coisas eram estranhas para mim, mas não chegaram a causar problemas. O primeiro contato com o solo brasileiro foi em São Paulo, passei dois meses lá e vim para a Bahia. Ao chegar à Bahia me parecia que estava em um país africano ou num pedaço da África. Primeiro a hospitalidade baiana é uma coisa guineense, acredito que muitos baianos vieram da guiné. Temos hábitos de brincar entre nós (guineenses), de chamar as pessoas aqui na Bahia de acordo com a semelhança fisionomica étnica guineense. Muitos se parecem com Bijagós, Balantas, Fulas, Mancanhas, Biafadas entre outras, mas para mim é um jeito de auto-afirmação de que os baianos são nossos parentes na diáspora. Essa semelhança acontece em várias áreas: no dançar, no jeito de cantar, na gastronomia, etc. Sinto-me em casa, os meus amigos zombam de mim quando falo que sou baiano, mas eu acredito nisso. Temos muitas coisas comum, parece que os europeus não conseguiram tirar a África de dentro dos que vieram, pois os dois continentes continuam unidos socioculturalmente e sócio espiritual. Infelizmente, a Bahia é o estado com menor número de estudantes africanos.
Bikodisse: Os governantes do seu país o ajudaram de alguma forma? Quais as maiores dificuldades encontradas nesse período aqui no Brasil?
Augusto Cardoso: Infelizmente me dá dor na alma quando falo do meu governo, pois é orgulho de qualquer cidadão sentir-se amparado e representado por seus governantes. Nunca tive ajuda do meu governo em nada, estudei por conta própria, até hoje não sei como consegui isso, mas não há nada na vida como a determinação, a fé e a certeza daquilo que queremos ser ou fazer, essa força interior é que me move, claro apoiado e motivado em outros objetivos de fazer parte do grupo de futuros gestores da minha pátria amada, Guiné-Bissau. Mas como NINDO (Deus) é comigo, muitos amigos e instituições, em especial a Biko, me deram bastante apoio neste caminho, eu aproveitei essa oportunidade e estou chegando onde sonhei estar um dia, claro que falta ainda muita coisa a fazer, mas eu tenho a certeza que estou no caminha certo.
Bikodisse: Você pensa em retornar para Guiné-Bissau?
Augusto Cardoso: Claro que sim, não existe melhor lugar no mundo que a nossa casa, nosso país, Guiné-Bissau i kasa ku no djunta (Guiné-Bissau é a nossa casa) onde eu devia estar, mas nem sempre as coisas acontecem como queremos, creio que em breve estarei de volta.
Bikodisse: De que forma você, pretende contribuir para a melhoria da qualidade de vida de seus conterrâneos?
Augusto Cardoso: Isso é relativo, pois qualidade de vida, para mim, é um conceito ocidental. Quero fazer parte do desenvolvimento do país, esse é o meu sonho, o sonho da nossa geração, por isso estou aqui me socializando com o mundo globalizado, para que amanhã eu esteja em condição de oferecer o melhor serviço à nação. Guiné-Bissau é um país rico em tudo, tanto em recursos naturais quanto humanos, mas hoje essas riquezas estão sendo mal aproveitadas pelos que detêm o aparelho administrativo guineense. Infelizmente o aparelho da governança guineense está entregue aos corruptos e inimigos da nação. O pai da nossa nação, Amilcar Cabral, falou a seguinte frase: “a nossa luta não era somente a independência ou de tirar o tuga (colonizadores) no solo guineense, mas também de entregar o poder ao povo guineense”, isso ainda não foi conseguido, pois o poder continua nas mãos dos antigos combatentes e mercenários do país. Mas enquanto o território pertencer aos guineenses, teremos a certeza de que a segunda parte da profecia do pai da nação será efetivada na Guiné.
Bikodisse: Como você conheceu a Biko?
Augusto Cardoso: É muito bom lembrar do primeiro dia que tive contato com a Steve Biko. Foi através de Ivete Sacramento, antiga Reitora da UNEB, ela me indicou a Biko, ainda tenho o cartão que ela me deu com o seguinte dizer: oi, pessoal de Steve Biko. Apresento-lhes o irmão de Guiné-Bissau, Augusto Cardoso. Meu abraço. Ivete Sacramento. 21/05/2002. Desde daquele dia até hoje a minha vida nunca mais foi a mesma, o nosso encontro (eu e Biko) deu certo e se tornou um amor prefeito que terminou em casamento, claro que a minha presença no instituto não é diária, mas sou Bikudo todos os dias, pois essa entidade me ensinou a ser Negro e líder Negro.
Bikodisse: Qual a sua opinião sobre o Pré-vestibular Steve Biko. e de que forma esse projeto contribuiu em sua vida pessoal e acadêmica?
Augusto Cardoso: Não tenho palavras para descrever a grandiosidade e qualidade dessa instituição nessa área. Na qualidade de um Guineense que veio para Bahia a fim de estudar num quadro de convênio entre duas nações que não deu certo, mas graças a Biko tive um pré-vestibular de graça, onde aprendi não só o caminha da entrada na Universidade, mas também a ter consciência negra. Essa é para mim a âncora ou a pedra fundamental da edificação do pré-vestibular Steve Biko. A Biko abriu portas para mim e me mostrou, através do cursinho de pré-vestibular, que é possível sim alcançar os meus objetivos, não só isso, essa Instituição me fez cidadão mundial-negro através de uma disciplina chamada Cidadania e Consciência Negra, recomendo essa disciplina a todos os baianos, ela virou a minha cabeça e me fez um homem com os pés firme no chão, confiante nas coisas que quero. O papel dessa disciplina é fundamental na formação de qualquer pessoa que passa pela Biko, sendo ele africano ou de qualquer outra parte do mundo, pois ensina a consciência negra, porque nem todos os negros têm a consciência negra, eu aprendi com Biko a ter essa consciência e a ser negro. Hoje posso dizer a mesma coisa para todos aqueles que almejam um curso superior, técnico, ou qualquer outra formação, que é possível sim, basta acreditar e levar a sério, pois a Biko faz a parte que lhe cabe fazer, a outra é de nossa responsabilidade. A minha vida acadêmica e o meu sucesso nessa empreitada do saber ocidental, devo a Biko. Biko não é simplesmente cursinho de pré-vestibular é uma entidade sociocultural, política e religiosa a minha opinião é que deve continuar assim. Por esses e outros motivos agradeço a Biko e toda a sua equipe, que dedicam tempo e dinheiro para formar o povo negro, seja ele Brasileiro, Africano ou de qualquer outra parte do mundo, pois O SABER BIKUDO não é ter ou saber muito, mas fazer uso inteligente e consciente do que se tem e do que se sabe.
Bikodisse: Após participar do Pré-vestibular Steve Biko você foi selecionado para a primeira turma do POMPA (Projeto Mentes e Portas Abertas) em 2004, cujo principal objetivo é a formação de jovens lideranças negras. Qual aprendizado dessa experiência?
Augusto Cardoso: A minha participação na primeira turma do Projeto Mentes e Portas Abertas–POMPA em 2004, teve inúmeros aprendizados. Como todos sabem, o objetivo do projeto era, e é, a formação das lideranças jovens negras, acredito que todos nós que passamos por esse projeto nunca mais seremos as mesmas pessoas.
Bikodisse: É verdade que você está se preparando para ser Presidente da Guiné Bissau?
Augusto Cardoso: Que pergunta. Claro que isso é verdade. Gostaria de ser o gestor número um da minha nação, pois acredito que somente assim estarei realizando a vontade e sonho meu e de todos os guineenses. Quero fazer parte dos futuros gestores da Guiné-Bissau, e essa realidade me move e leva-me a pensar no cargo mais importante de um país, mas isso não significa que não sonho com outros cargos, como o de primeiro ministro ou de ministro de administração interna. As minhas ambições estão em servir o país e dar o rumo e lugar que a Guiné-Bissau merece nesse mundo globalizado, não o que o país ocupa hoje.
Bikodisse: Qual a linha de pesquisa do seu mestrado?
Augusto Cardoso: A linha de pesquisa do meu mestrado é poder e organizações. Com o tema: Saberes e práticas tradicionais da etnia bijagós e suas relações com a organização, a gestão e a conservação da biodiversidade na Guiné-Bissau.
Dentro desta problemática, busco analisar qual é a relação entre a sociodiversidade e a biodiversidade no âmbito dos saberes e práticas tradicionais dos espaços e dos recursos que estão associados à cultura étnica Bijagós no atual contexto de globalização. Neste contexto, procura-se caracterizar a maneira como os guineenses se estabeleceram como povo e os primeiros contatos interétnicos entre os nativos da Guiné-Bissau e os portugueses “invasores” que desembarcaram na costa ocidental da África, com finalidade de conquistar novas terras para a coroa portuguesa.
Abordando também o modo como o estado guineense tem formulado, criado e implementado os instrumentos legais de gestão do saber tradicional e a conservação da biodiversidade no Arquipélago dos Bijagós.
Partido do entendimento de que Saberes e Práticas Tradicionais Bijagós, associados à biodiversidade, vão desde as técnicas de manejo de recursos naturais, alimentícias e agrícolas de espécies, métodos de caça e pesca, conhecimentos sobre os diversos ecossistemas e sobre propriedades farmacêuticas, até as próprias categorizações e classificações de espécies de flora e fauna utilizadas pelas populações tradicionais bijagós. Tendo em conta que os saberes e práticas tradicionais Bijagós são conhecimentos produzidos a partir de atividades e práticas coletivas.
Bikodisse: Conte-nos um pouco dessa conquista.
Augusto Cardoso: A conquista é nossa: minha, da Guiné-Bissau, da Biko e de todos aqueles, que de um modo ou de outro, participaram e me apoiaram nesse caminhada espinhosa que é a academia. Foi duro, mas estamos aqui no curso de Administraçao-Ufba, fazendo aquilo que almejamos ser um dia, pois, dianti ki kaminhu.
Bikodisse: O Instituto Steve Biko tem a visão de constituir-se numa Instituição de Ensino Superior (IES) em 2012. Como você se vê nesse processo?
Augusto Cardoso: Para mim já passou da hora disso acontecer, a experiência do Instituto Steve Biko em diversas áreas, é mais que suficiente para torná-lo: UniBiko, mas vamos seguir firmes, começando com a Instituição de Ensino Superior. Vejo esse processo como continuação daquilo que tem sido feito pelo Biko e sei que essa instituição será um marco referencial para as outras entidades brasileiras.
Bikodisse: Que conselhos você dá para outros jovens africanos que pensam em estudar no Brasil?
Augusto Cardoso: Que nunca deixem de ser africanos, que sejam orgulhosos em se identificar como tal, que sejam sempre humildes e atentos á todas as oportunidades que a vida oferece neste país e que aproveitem a estada para aprender com os brasileiros, principalmente com as Lideranças Negras, pois esses têm muito a nos ensinar (é uma outra experiência de negritude), que não fiquem trancados na academia, e lembrem que o objetivo é retornar e ajudar na reconstrução de nossos países e do nosso querido continente.
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ResponderExcluirEmocionante...
ResponderExcluirParabéns Augusto prossiga na missão. Faço questão de ter cidadania guineense para votar na sua candidatura. rsrsr.
Um grande abraço.
augusto fico feliz em saber que vc sonha com algo que é dificil mas não impossível de se alcançar, torço pela sua vitória e espero de alguma forma contribuir para que vc consiga realizar seu sonho, vamos lá guiné-bissau e o brasil juntos nessa caminhada, sucesso.
ResponderExcluirA saga de Almicar Cabral continua...Através de lideranças africanas como Augusto Cardoso retroalimentamos o nosso espirito panafricanista e desde a diaspora africana, renovamos o nosso sonho de ver a Africa livre e unida... Pra frente Augusto! A luta é justa e a sua vitória será nossa vitória também!
ResponderExcluirNa fé guerreiro!
Lio Nzumbi