sábado, 1 de maio de 2010

Steve Biko ( parte 2)


Consciência Negra

O jornalista branco sul-africano Donald Woods, diz que a idéia que estava por trás da Consciência Negra era romper quase inteiramente com as antigas atitudes negras em relação à luta pela libertação e estabelecer um novo estilo de auto-confiança e dignidade para os negros, como uma atitude psicológica que levasse as novas iniciativas. O primeiro manifesto da OESA, criada em 1969, data de 1971. Ela seria ponta de lança de um movimento muito mais amplo do qual se3 reivindicaram organizações como a BCP - Black Community Programmes(Programas da Comunidade Negra), BAWU-Black Allied Worker´s Union e NAYO-National Youth Organization, todas agrupadas dentro do BCP-Black People Convetion. Ao contrário de Woods, Barney Pityana diz que Consciência Negra não teve nada de novo. O movimento, segundo ele, tinha plena consciência de pertencer a uma longa tradição de resistência popular, que buscava inspiração no etiopismo e outros movimentos proféticos religiosos africanos, nas lutas pela terra que deram impulso ao Congresso dos Nativos da África do Sul (nome original do CNA), africanismo e em muitas outras tendências.

Biko foi provavelmente o primeiro dirigente político negro da África do Sul a questionar publicamente o papel dos liberais brancos na luta contra o regime racista do africâner, apontando a ncessidade dos negros construírem suas próprias organizações. Ele acreditava na viabilidade de uma estratégia de libertação sem violência, propondo-se a atuar dentro dos limites da legislação vigente do país. Vejam como o próprio Biko fala de sua concepção de luta: "Na verdade, como enfatizamos, nós do Consciência Negra éramos considerados como defensores do sistema. Os liberais nos criticavam e os conservadores nos apoiavam. Mas isso durou pouco. O governo levou 4 anos para tomar medidas contra nós.


Assim, como um prelúdio, os brancos devem ser levados a perceber que também são humanos, não superiores. O mesmo com os negros. Eles devem ser levados a perceber que também são humanos não inferiores

Mesmo hoje(1977) ainda somos acusados de racismo. Isso é um erro. Sabemos que todos os grupos interraciais na áfrica do Sul reproduzem relações nas quais os brancos são superiores e os negros inferiores. Para nós isso significa que a África do Sul não é européia, mas sim africana. Gradualmente isso começou a fazer sentido. A Consciência Negra ganhou impulso, mas ainda enfrentavamos o problema prático de que a maioria das pessoas que falavam eram estudantes ou diplomatas. Não havia debate amplo. Por essa razão tivemos que ir da OESA para a organização da Convenção do Povo Negro, de modo que as massas pudessem envolver-se com o desenvolvimento de uma nova Consciência. A CPN foi fundada em 1972. Foi então que o governo começou a entrar em ação, prescrevendo líderes individuais da CPN".

O Consciência Negra nasceu e se fortaleceu entre o final da década de 60 e o incío dos anos 70, um período durante o qual o regime racista sul africano havia conseguido prender, proscrever ou banir do país as principais lideranças tradicionais dos negros, como Nelson Mandela, do CNA (Congresso Nacional Africano) e Robert Sobukwe, do CPA (Congresso Pan- Africanista), uma antiga dissidência do CNA). Nessa época, o Partido Nacionalista Africâner, no poder desde 1948, tentava aprofundar a política apartheid, que entre outras coisas tinha o objetivo de tornar os negros sul-africanos estrangeiros dentro do seu próprio país. O movimento Consciência Negra tinha uma estratégia contra essa política bantustanização e inferioridade racial, realizando reuniões, palestras, discussões e, particularmente, mobilizações escolares como forma de criar consciência e unidade.

O levante popular de Soweto, ocorrido no verão de 1976, apesar de espontâneo, foi em grande parte consequência da ação conscientizadora da Consciência Negra. Ele aconteceu quando o governo racista tentou impor o afrikaans, a língua dos boers, como idoma oficial das escolas da África do Sul. Um protesto pacífico de estudantes negros contra a medida foi afogado em sangue pela polícia do governo racista, resultando na morte de 600 manifestantes. Soweto foi ponto alto de um processo de retomada das lutas de contestação ao regime racista, depois do fracasso da luta armada empreendida pelo CNA e PAC, organizações proibidas e que atuavam na clandestinidade. Iniciada por sucessivas ondas de greve realizadas pelos trabalhadores negros nos primeiros anos da década de 70, esse movimento marcaria o ingresso das massas no cenário político da África do Sul, abrindo caminho para as grandes transformações que assistimos agora naquele país.


Fonte: Revista Pode Crê, Ano I- Ago/Set - 1993, nº 2

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